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O impacto da cultura popular nos estereótipos de género e na participação das mulheres em STEM e nos negócios

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1. Introdução

O projeto 4EQUALITY aborda o sério desafio que as jovens enfrentam nas áreas de STEM (ciência, tecnologia, engenharia e matemática) e nos negócios. Apesar do forte investimento em educação e desenvolvimento de competências alinhadas com as necessidades do mercado de trabalho, muitas mulheres encontram obstáculos quando procuram empregos que correspondam às suas competências.

Embora as reformas políticas e as iniciativas educacionais sejam fundamentais, o impacto da cultura popular na formação de perceções e aspirações não deve ser subestimado.

A televisão, o cinema, a música e as redes sociais são veículos poderosos para construir e perpetuar os papéis de género, influenciando a forma como as jovens veem as suas carreiras potenciais e o seu lugar nessas indústrias. Este artigo explora como a cultura popular afeta as normas de género relacionadas com as carreiras em STEM e negócios, com foco na representação das mulheres cientistas, engenheiras, empreendedoras e líderes nos meios de comunicação, e discute como o projeto 4EQUALITY pode incorporar essas ideias para promover mudanças culturais e educacionais.

2. A Cultura Popular e a Construção dos Papéis de Género nas Áreas STEM e nos Negócios

Desde a infância até a adolescência e a vida adulta, as pessoas absorvem histórias culturais sobre os papéis de género que influenciam muito a sua identidade, ambições e escolhas de carreira. A cultura popular é um lugar central onde essas histórias são criadas, reforçadas ou questionadas.

Música: As Mensagens de Género nas Letras e na Representação

Na música popular, as mulheres são tradicionalmente retratadas em papéis que enfatizam a aparência, a emoção e os relacionamentos, enquanto os homens são mais frequentemente retratados como líderes poderosos e autônomos ou inovadores. Os videoclipes e as letras das músicas frequentemente reforçam os estereótipos de género:

  • As artistas mulheres são muitas vezes sexualizadas ou limitadas a papéis românticos ou de cuidado.
  • Os artistas homens geralmente se apresentam como agentes de mudança, riqueza ou autoridade.

Cinema e Televisão: Influência Visual e Narrativa

A mídia visual, como filmes e séries de TV, tem narrativas e imagens que definem quem é “bom” para STEM e negócios. Mesmo com o progresso, muitas representações ainda são baseadas em estereótipos:

  • Os homens dominam a tela como heróis confiantes, que resolvem problemas e são líderes
  • Quando aparecem, as personagens femininas podem ser interesses românticos, alíneas cômicas ou retratadas como lutando para equilibrar a carreira e a vida familiar.
  • As mulheres cientistas são frequentemente ausentes ou relegadas a papéis secundários.

Essas representações influenciam tanto a perceção do público quanto a auto-perceção, moldando as ambições e crenças das jovens sobre o seu lugar nas áreas STEM e nos negócios.

3. A Complexidade das Representações na Mídia: Comédia, Estereótipos e o Papel do Humor

A forma como a mídia mostra as mulheres em áreas como ciência, tecnologia, engenharia e negócios não é só um reflexo da realidade — é uma força construtiva que molda a compreensão cultural e as expectativas sociais. A comédia, em particular, tem uma influência única. Ela pode desafiar as normas através da sátira e da subversão ou reforçá-las sob o disfarce de entretenimento inofensivo. A representação das mulheres em áreas como ciência, tecnologia, engenharia e negócios na comédia televisiva e no cinema muitas vezes caminha numa linha tênue entre o empoderamento e o retrocesso, tornando-se um ponto-chave da análise cultural sobre a representação de género.

3.1 Sexismo Irónico e «A Armadilha da Trilha Sonora do Riso»

Uma das coisas mais comuns nas representações cômicas das mulheres em STEM é o uso do sexismo irónico — piadas que parecem gozar com atitudes sexistas, mas que acabam reforçando-as porque contam com o conhecimento do público sobre esses estereótipos. A presença de risadas gravadas ou reações exageradas diz aos espectadores o que é engraçado, validando sutilmente ideias ultrapassadas.

Por exemplo, muitas personagens femininas em STEM são retratadas de forma a desvalorizar a sua experiência:

  • Grande parte do seu tempo no ecrã é focado nas suas relações, aparência ou falta de jeito social.
  • Quando elas falam sobre coisas intelectuais, muitas vezes são recebidas com comentários condescendentes ou usadas como piadas.
  • A sua competência profissional é frequentemente ofuscada pelo seu papel como esposa e mãe.

3.2 O clichê “Carreira vs. Vida Pessoal”

Outro tema que aparece sempre nas comédias é a ideia de que as mulheres têm que escolher entre uma carreira legal e uma vida pessoal feliz. Isso rola em vários tipos de programas, mas é mais comum em sitcoms e comédias românticas. A tensão é muitas vezes mostrada de forma engraçada, mas a mensagem continua a mesma: carreiras em áreas como ciência, tecnologia, engenharia e matemática não combinam com ser mulher, ser mãe ou ter um romance.

Essa narrativa minimiza a complexidade das mulheres reais que lidam com carreiras exigentes e vidas pessoais. Em vez de oferecer retratos matizados, a comédia muitas vezes simplifica essas tensões em piadas unidimensionais, reforçando o mito de que o sucesso profissional vem à custa da felicidade pessoal.

3.3 A Narrativa da «Exceção» ou da «Mulher Simbólica»

Em muitas comédias, as mulheres em STEM são retratadas como exceções em espaços dominados por homens. Embora isso reflita a realidade demográfica, corre-se o risco de normalizar a ideia de que as mulheres são anomalias em STEM, em vez de contribuintes essenciais. Isso também cria uma narrativa em que as mulheres estão constantemente a lutar pela legitimidade.

Essa abordagem não ajuda muito a normalizar a diversidade de género. Em vez disso, ela amplia a sensação de isolamento e “alteridade” que muitas mulheres na área de STEM relatam na vida real, uma experiência bem documentada na pesquisa de campo do projeto 4EQUALITY.

  1. Repetição e normalização: O Poder dos Estereótipos no Ecrã

Uma das formas mais poderosas que a mídia usa para moldar a perceção do público é através da repetição. Quando estereótipos sobre mulheres em STEM são constantemente retratados na televisão, no cinema ou nas redes sociais, eles se tornam normalizados e absorvidos pelo imaginário coletivo como se fossem verdades universais.

  • Se a maioria das representações cômicas mostra mulheres cientistas como socialmente desajeitadas, emocionalmente instáveis ou alvo de piadas, o público começa a internalizar essas características como típicas ou esperadas.
  • Quando personagens femininas em cargos de liderança na ciência ou na tecnologia são retratadas como incompetentes, neuróticas ou incapazes de equilibrar a vida pessoal e profissional, isso reforça a crença de que as mulheres não pertencem naturalmente a essas áreas.

Esse tipo de normalização tem consequências reais. Como o projeto 4EQUALITY mostra, muitas mulheres jovens que estudaram STEM ou negócios ainda enfrentam preconceito, discriminação e falta de reconhecimento no trabalho, mesmo sendo super qualificadas. Essas barreiras não estão só nas políticas institucionais ou práticas de contratação, mas também em crenças culturais bem enraizadas, muitas das quais são moldadas pela ficção.

Para mudar a realidade, também precisamos mudar as histórias que contamos e consumimos. Mostrar regularmente mulheres competentes, criativas e respeitadas em áreas científicas e técnicas não é só uma questão de representatividade, é uma ferramenta estratégica para a transformação social.

4. Caminhos Para a Mudança: Como Melhorar a Representação das Mulheres em STEM na Cultura Popular

Como esta análise mostrou, a cultura popular pode reforçar estereótipos de género prejudiciais, mas também tem o poder de transformá-los. Para conseguir mudanças significativas, é preciso uma abordagem mais intencional e colaborativa, que envolva criadores de conteúdo, educadores, instituições e plataformas de comunicação. Aqui estão algumas propostas concretas:

  • A mídia e o entretenimento devem criar personagens femininas realistas nas áreas STEM e evitar reforçar estereótipos por meio de humor sexista ou papéis redutores.
  • Os sistemas educacionais devem usar exemplos positivos da mídia para inspirar os alunos, ensinar literacia mediática e envolver mulheres cientistas reais como modelos a seguir.
  • As instituições e a sociedade devem apoiar iniciativas como a 4EQUALITY, financiar pesquisas sobre o impacto da mídia e construir parcerias para promover narrativas inclusivas e empoderadoras.

Ao coordenar os esforços entre criadores de conteúdo, educadores e decisores políticos, podemos reformular as narrativas culturais e incentivar mais mulheres jovens a seguir e prosperar em carreiras STEM.

5. Conclusões: Histórias que Transformam

A representação é importante, não só porque a mídia reflete a realidade, mas também porque ela molda, reforça e, às vezes, limita essa realidade. Para as mulheres em STEM, a cultura popular sempre mostrou uma imagem contraditória: invisibilidade, caricatura, idealização romântica ou excepcionalismo.

O projeto 4EQUALITY existe para apoiar mulheres jovens que ainda enfrentam barreiras estruturais e culturais ao seguir carreiras em áreas dominadas pelos homens, como ciência, tecnologia e negócios. Entender como a cultura popular ajuda a construir ideias de talento, liderança e pertencimento é crucial para derrubar essas barreiras.

No fim das contas, mudar as histórias que contamos faz parte de mudar o mundo. E cada história conta.

6. Referências

Frontiers in Psychology (2017). Adolescent Girls’ STEM Identity Formation and Media Images of STEM Professionals. https://www.frontiersin.org/journals/psychology/articles/10.3389/fpsyg.2017.00716/full

Hancock, N. (2018, November 20). From Scully to Shuri: how pop culture is powering girls’ interest in STEM. create Digital. Retrieved from https://createdigital.org.au/scully-shuri-pop-culture-girls-interest-stem/

Steinke, J. (2022). The role of media professionals in perpetuating and disrupting stereotypes of women in Science, Technology, Engineering and Math (STEM) fields. https://www.frontiersin.org/journals/communication/articles/10.3389/fcomm.2022.1027502/full

The Australian National University. (13 March 2025). Pop culture portrayals of women in STEM are no laughing matter. ANU College of Systems & Society. Retrieved from https://reporter.anu.edu.au/all-stories/pop-culture-portrayals-of-women-in-stem-are-no-laughing-matter